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Outro dia eu dei like numa garota

Outro dia eu dei like numa garota porque ela parecia você. Ela tinha várias coisas que me lembravam de você: os olhos amendoados, o nariz gordinho na ponta, o sorriso largo e o cabelo castanho preso em um rabo na diagonal da cabeça. E eu também tenho várias coisas que me lembram de você: a caneca do Lula, a coruja de pelúcia, o colar preto e a tatuagem na diagonal do braço. Já faz quase três anos que você foi embora. E têm várias coisas de você que eu já não me lembro mais. Às vezes, acho que te esqueci. Passam-se dias. Aí eu lembro. Lembro e me pego às 21h18 de uma quarta-feira de trabalho desgraçado pensando no que a gente poderia ser. E o louco é que eu nem te conheço mais, eu só lembro. Não sei quem são seus amigos, quais são suas dores ou como anda seu namorado. A escola que dá aula e o ônibus que te pega de manhã no seu novo endereço. O café favorito. Se você gostou do novo álbum do Busted. Se ficou triste com a prisão do Lula. Se assistiu o casamento real ou a s

Z

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Dizem que avó, por via de regra, é mãe duas vezes. As pessoas dizem muita bobagem. Zenaide era mãe três vezes. Sozinha na criação de três filhos, fez de sua história um caso de sucesso em um enredo repetido com outras várias mulheres fortes. Dizem também que avó é mãe com açúcar. Parece simplório. Zenaide era mãe com uma latinha de cerveja. No carnaval, foi mãe com um frasco de lança-perfume. Numa era pré-proibição, posou orgulhosa para o retratista com sua droga de escolha. Eventualmente Zenaide era também mãe com um cigarro na mão, tragado com leveza. A leveza que nunca lhe tirou o dom da intensidade. Carnavais, festas, batons vermelhões, bailes às escondidas. Reuniões na escola, batizados de boneca, fritadas infinitas de pastel de queijo, presunto, tomate e “oréga”. Zenaide ia e vinha. Sozinha, acompanhada, como queria. Nunca houve homem ou mulher que nela mandasse. Esperou pacientemente pelo desafio durante 87 anos. Não conseguiram. Como um último ato de rebeldia, jo

Remembering Sunday (pt. 3)

All Time Low - Remembering Sunday Iniciar. Microsoft Office. Word. Tudo que sempre quis te dizer Hoje faz seis anos. Não hoje exatamente – parei de contar depois do segundo aniversário já que me pareceu contraprodutivo -, mas a grosso modo. Seis anos que tudo mudou. Eu, você, o mundo. O céu se abriu e se fechou com a velocidade de um foguete ultrassônico. Você dormiu nos meus braços naquele dia, daquela vez. Um tsunami. Doía estarmos juntos. De alguma forma, truncada, você tentou. Pelos dias que se seguiram  - mas por tempo longe do suficiente -  fomos felizes. Eternos, suficientes. Juntos. Passou. A vida se encarregou de lavar e levar tudo embora. O castelo na areia, a porra toda. A onda veio com força. Em vez de me levantar – como fazem as melhores ondas -, me enterrou. Não fomos. Ficamos. Apesar de tudo, permanecemos. É estranho olhar nossas vidas agora. Tudo o que poderia ter sido e toda aquela papagaiada.  As imagens permanecem longes, difusas. Tudo parece idealiza

balanço

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(Foto: Reprodução/Instagram) vai . o ano de 2015 acabou - finalmente. a comunicação alerta: odiamos estar vivos. torcemos para que o tempo passe rápido. matamos o tempo, fugimos da angústia ou da solidão . na esperança da aceitação da produtividade, nos ocupamos até o talo. tempo livre abre brecha pra cabeça voar livre, a solidão é perigosa. volta . terminar o ano tende a trazer um gosto amargo à boca. nessa época, lembramos do que deu errado com as todas as cores que não teve. vai . um ano estranho, cheio de buracos camuflados pra gente cair dentro. as lacunas parecem ter deixado um legado - sempre deixam. dois mil e quinze. parecia não acabar, pareceu longo. pareceu cinco anos num só - não de uma maneira boa. aos corajosos, recomendo a psicanálise - ou a terapia que mais apeteça. volta . é como fazer musculação, quase. às vezes a gente acha que não vai aguentar. os bracinhos fraquejam e a coluna dói com o peso. a cada passo, um compasso. a gente se estica, desdobra e

A fera na selva, por Henry James

"Não incomodava os outros com excentricidade de obrigá-los a conhecer um homem mal-assombrado, ainda que em certos momentos tivesse a maior tentação de ouvi-los dizer que estavam eles próprios bastante assombrados. Se ficasse tão assombrados quanto ele - que nunca deixara de estar uma hora sequer de sua vida - saberiam o que isso significava. Mesmo assim, não lhe cabia assombrá-los, e ele se limitava a ouvi-los com suficiente civilidade. Esta a razão pela qual tinha tão boas maneiras - embora possivelmente fosse um tanto sem graça; esta razão, acima de tudo, se considerava um homem razoavelmente - e até, quem sabe, extraordinariamente - desprendido num mundo ganancioso."

carta ao meu professor de Jornalismo.

Manoel Às vezes, quando as contas estão todas pagas, e vaga-me espaço mental para divagações, me questiono sobre a crise do Jornalismo. Para além disso, me questiono se é de fato uma. Não me entenda mal, a notícia das 20 demissões na Folha de Londrina será sempre aterrorizante. Porém, do alto do meu segundo ano de academia - e com toda prepotência que só a nossa graduação poderia me oferecer -, não consigo ver isso, as demissões, como sintoma de uma crise do Jornalismo em si, mas sim do atual modelo de gestão de negócios. Parafraseando (porcamente) Peter Burke, percebo que com o advento de cada nova tecnologia, profetiza-se o fim de sua antecessora. E, nomeando o gigante elefante entre nós, a suposta grande culpada da crise do Jornalismo contemporâneo é a internet. Com ela, se viram desestruturados os vigentes sistemas de distribuição de conteúdo. Pouquíssimas pessoas estão dispostas a pagar por um conteúdo que possam acessar gratuitamente. Ponto. O suposto fim de um jornal imp

Você me valida

Você é a única pessoa que me valida, me torna inteiro. Você me transforma em realidade, me faz palpável. Você me dá a segurança, o pé no chão. O porto seguro. Mas não é de um jeito que me causa dependência. Veja bem, meu bem. Você me completa. Com as suas inúmeras falhas, me torna um só. Duas metades de uma alma, chame o que quiser. Me ame. Te amo. Além do fim e dos fins, quero para sempre. E sem explicação. E meu medo inominável que você precise de uma, uma explicação. Você traz em si esse medo, essa necessidade tão humana? Essa que me tira o ar e as palavras? Você é mais do que eu preciso mas meu temor é que eu não seja a metade das suas necessidades. Você clama que eu sou tudo e muito mais mas eu morro – veja bem, morro, todos os dias um pouquinho -  de medo de que eu seja o melhor que você conseguiu. Quando eu sinto – e eu sei -  que você é o melhor que eu posso conseguir. Nessa vida e em outras. Eu reafirmo: você me reafirma. Me torna mais eu, cada dia. Só me entendo e me sint